segunda-feira, 23 de abril de 2007

Pensilvânia e Aristides I – No tanque


Pensilvânia vive num tanque.
Lava roupa encardida para sempre.
Distraída, canta:
- Eu tenho medo do Cão
Não gosto de Chifrudo
E tenho medo de Cão...

Num segundo Pensilvânia escuta um ruído agudo, desafinado.
Aristides entra apressado:
- Pensilvânia!... Vai pra puta que o pariu já.
Pensilvânia responde:
- Vou. Mas te levo... Cão!!!
Aristides, orgulhoso, gargalha:
- Me leva... Me leva porca gostosa...
Gargalhada de sufocar.
Pensilvânia duvida da ousadia. Fica três segundos parada. Água correndo no tanque. Seus olhos do tamanho do mundo. Enche as mãos com sabão em pó e esfrega forte no rosto de Aristides.
Aristides limpa o rosto com as mãos. Junta o sabão em uma delas e nova ordem:
- Lambe aqui na minha mão.
Pensilvânia olha ao homem desde os pés descalços até a ponta da cabeça sem nem um fio de cabelo. Repara na barriga dependurada sobre o elástico do calção do Palmeiras e na tatuagem do lado esquerdo do peito... Amor só de mãe.
- Aristides... Quem disse que eu te odeio?...
Sorri aberto. Chega junto ao homem e pega-lhe a mão. Cai sobre a terra o punhado de sabão.
- Aristides... O que um come o outro vai ter de engolir.
Aristides olha os seios grandes da mulher. Suspira longo. Vira-se. Sai para outras bandas.
Pensilvânia volta-se para o tanque.
Tudo entupido. A roupa bóia, a água escorre e no chão uma espuma branca do punhado de sabão que ninguém comeu.

Marcia Bernardes

Kapota

Nenhum comentário: